A Lei Complementar nº 706/2021 foi contraditória no conjunto de seus artigos, acompanhada de diversas inconsistências jurídicas envolvendo o conceito e caracterização de autarquia e segregação de funções envolvendo a COMCAP. Cabe destacar que o funcionamento da administração indireta mediante autarquia é disciplinado pelo Decreto Lei Federal nº 200/67, e pela Lei Orgânica do Município de Florianópolis. Já a segregação de funções decorre do princípio da moralidade (art. 37, da CF/88). Esta inconformidade jurídica está presente na relação entre a administração direta e indireta da Prefeitura Municipal de Florianópolis adotada pela Lei Complementar nº 706/2021, no Decreto Municipal nº 22.569/2021 (regimento interno da Autarquia de Melhoramentos da Capital – COMCAP), envolvendo a COMCAP.
Antes de entrar no mérito desta representação, alertamos que o Governo Municipal de Florianópolis, sem freio legal, propõe leis e Decretos desconectado com a sua Lei Orgânica Municipal. Exatamente a Lei Orgânica, que no âmbito do Município de Florianópolis, é uma espécie de “Carta Magna Municipal”, no seu limite territorial (do Município). Dessa forma, os atos administrativos do Governo Municipal não podem feri-la. Aliás, no nosso entendendimento, jamais poderia ferir quaisquer normas sob pena de infringir o princípio da legalidade. E cabe ao Poder Judiciário e ao Ministério Público atuar na existência de conflitos legais, na sua função garantidora dos direitos fundamentais e do Estado Democrático de Direito e impedir estes abusos dos poderes e de suas competências.
Assim transcorreu quando da transformação da COMCAP, de empresa de Economia Mista para Autarquia, mediante a Lei nº 618/2017. A mensagem do Governo Municipal nº 62/2017 encaminhada para a Câmara Municipal de Florianópolis – CMF não atendeu os preceitos legais presentes na Lei Orgânica do Município de Florianópolis, presentes nos parágrafos 5º e 6º do Artigo 17, in verbis:
Art. 17 A Administração Pública Municipal é formada dos órgãos integrados na estrutura administrativa da Prefeitura e de entidades dotadas de personalidade jurídica própria, compreendendo:
- 5º A criação de autarquia, de constituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e suas subsidiárias ou a instituição de fundações públicas de quaisquer das entidades mencionadas neste parágrafo, dependerá de lei específica. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 34/2012).
- 6º A transformação, fusão, cisão, extinção, dissolução, transferência do controle ou privatização de quaisquer das entidades mencionadas neste parágrafo, dependerá de lei específica com posterior consulta popular, sob forma de referendo. (Redação acrescida pela Emenda à Lei Orgânica nº 34/2012). Grifo nosso.
Conforme o parágrafo 6, o Governo Municipal ao transformar a COMCAP de Economia Mista para Autarquia, não apresentou aos munícipes a devida consulta popular sob forma de referendo, como foi ressaltado durante a reunião da Câmara Municipal de Florianópolis por vereadores, alertando que pelo artigo 17 da Lei Orgânica do município havia a necessidade do referendo popular (Gean Loureiro sanciona lei que transforma Comcap em autarquia – FloripAmanhã (floripamanha.org).
De fato, não pode o Governo Municipal de Florianópolis descumprir leis, sejam elas nacionais, estaduais ou municipais, isto porque é decorrência lógica do direito brasileiro, que o princípio da legalidade é diretriz de observância obrigatória no Estado Democrático de Direito. Regra legal presente na Constituição Brasileira consolidada no artigo 19 da Lei Orgânica de Florianópolis, assim afirma este preceito:
Art. 19 A Administração Pública Direta e Indireta do Município, visando à promoção do bem público e à prestação de serviços à comunidade e aos indivíduos que a ela integram, observará os princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade, da eficiência, e os seguintes: (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 06/2002).
Infelizmente, o descompasso não está presente apenas entre a Lei Complementar nº 706/2021 e a Lei Orgânica do Município, mas também no âmbito da Lei Federal nº 11.445/2007 e das Leis Municipais nºs 7474/02007 e 9400/2013. Reforçando nosso entendimento legal, a Lei Complementar nº 706 de 27 de Janeiro de 2021 não alterou as Leis Municipais nºs 7474/2007 e 9400/2013, havendo inconsistências jurídicas a serem corrigidas. Principais:
- Fundo Municipal de Saneamento Básico atrelado a Secretaria Municipal de Infraestrutura e o Conselho Municipal de Saneamento Básico – COMSAB, vinculada a Secretaria Municipal de Meio Ambiente. O COMSAB por Lei Municipal nº 7474/2007 deve em conjunto com a Secretaria de Infraestrutura colaborar na administração do Fundo Municipal de Saneamento Básico;
- O Conselho Municipal de Saneamento Básico vinculado pela Lei Complementar nº 706/2021 foi atrelado a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, sendo pela Lei Municipal nº 7474/2007 presidido pelo Secretário Municipal de Habitação e Saneamento, em descompasso com a política de Saneamento Básico de Florianópolis;
- A Lei Municipal nº 9400/2013 assim como o a Lei Municipal nº 7474/2007 centraliza todas as dimensões do Saneamento Básico numa única estrutura administrativa, enquanto a Lei Complementar nº 706 de 27 de Janeiro de 2021 distribui as dimensões em diversas Secretarias Municipais;
- Duplicação de atribuições da política de saneamento básico em diversas Secretarias, impactando no atendimento das metas e ações do PMISB e PMIGIRS;
- As alterações sancionadas na Lei Complementar nº 706/2021 não levou em consideração as avaliações do COMSAB, o Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico – PMISB, aprovado pela Lei 9400/2013, a Lei do Lixo Zero aprovado pelo Decreto 18.646/2018, o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos – PMIGIRS, aprovado pelo Decreto nº 17.910/2017, das conferências municipais e do PMISB e respectiva revisão;
- As alterações sancionadas não permitem regulação dos serviços de Resíduos Sólidos, por uma Agência de Regulação, como determina a Lei Federal nº 11.445, o PMISB e respectivas revisões, no âmbito do Município de Florianópolis, pelo atrelamento dos serviços da COMPAP direto a duas Superintendências vinculadas à Administração Direta e de um Diretor Presidente, como o Secretário Municipal de Infraestrutura;
- A Lei Complementar 706/2021 com a inclusão da Secretaria do Meio Ambiente não assegurou a paridade entre nos termos da Lei Federal nº 11.445/2007, conforme reafirmado pelo Art. 6º da Lei Municipal 7474/2007;
Ora, como veremos mais adiante, além de não cumprir os dispositivos legais, também transformou a COMCAP em dois grandes Departamentos da Administração Direta, interferindo em sua autonomia enquanto uma empresa pública da Administração Indireta, através da Lei Complementar nº 706/2021, abordada a seguir.
- IMPACTO DA LEI 706/2021 NA AUTONOMIA DA COMPAP:
A Lei Complementar nº 706/2021, em seu artigo 13 é bem clara, quando conceitua a Administração Indireta como sendo órgão de entidade pública de personalidade jurídica própria, instituída por Lei, para desenvolver atividades específicas, seguindo o que determina o Decreto Lei 200/67. Assim expressa o artigo 13:
“Administração Indireta se constitui de órgãos e entidades públicas dotadas de personalidade jurídica própria, instituídas por Lei, para desenvolverem atividades específicas, obedecendo aos seguintes princípios constitucionais:
I – as autarquias e as fundações públicas de direito público funcionarão segundo as diretrizes dadas pelas leis de criação e respectivos regimentos internos.
- 1º São autarquias da Administração Municipal as seguintes entidades:
IV – Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP);”
Desta forma, o artigo 13 além de estar em consonância com os princípios constitucionais e com o Decreto Lei 200/67, destaca que a COMCAP em seu parágrafo 1º é uma AUTARQUIA. Dentro exatamente do que preceitua o Decreto-Lei nº 200/67 afirma que: “o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública requer gestão administrativa e financeira descentralizada”.
Além disso, a Lei Orgânica do Município de Florianópolis em seu parágrafo 1º do artigo 17, também segue os princípios constitucionais e as leis específicas:
Art. 17 A Administração Pública Municipal é formada dos órgãos integrados na estrutura administrativa da Prefeitura e de entidades dotadas de personalidade jurídica própria, compreendendo:
II – As entidades da Administração Indireta dotadas de personalidade jurídica própria:
a) Autarquias;
- 1º A autarquia, com patrimônio e receita própria, gestão administrativa e financeira descentralizada, organizar-se-á para o desempenho de atividades típicas da administração pública que necessitem de mais agilidade e independência na prestação de serviços à comunidade; (grifo nosso).
Por esta conceituação a empresa COMCAP enquanto autarquia, se situa na administração pública indireta da Prefeitura Municipal de Florianópolis, que deverá ser formada pelo conjunto de pessoas jurídicas vinculadas à administração indireta, dotadas de personalidade jurídica própria para o exercício de atividades administrativas de forma descentralizada, devendo ser fiscalizada e acompanhada pela Administração Direta do Governo Municipal de Florianópolis. Assim ficou bem claro na Lei 618/2017, que criou a Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP), em vigor no Município:
Art. 1º Fica criada a Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP), pessoa jurídica de direito público, pertencente à administração indireta do município de Florianópolis.
Art. 2º A Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP) reger-se-á por esta Lei Complementar e por seu Regimento Interno, observado:
I – seus atos possuem natureza jurídica de ato administrativo, e gozam da presunção de legitimidade, imperatividade e autoexecutoriedade;
II – suas licitações e contratos administrativos subordinam-se ao regime da Lei nº 8.666, de 1993, e respectivas alterações;
III – seus bens são inalienáveis e imprescritíveis, enquanto afetados à realização de serviços públicos;
IV – sua responsabilidade civil será objetiva na ação e subjetiva na omissão;
Art. 3º O Presidente, os Diretores e os demais ocupantes de cargos comissionados e funções gratificadas, da Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP), constantes do anexo único desta Lei Complementar, são de livre nomeação e exoneração privativas do Chefe do Poder Executivo.
Nesta linha de raciocínio, o artigo 2º e seus incisos confirmam que a COMCAP goza de presunção de legitimidade, imperatividade e executoriedade para reger-se no limite da Lei, com responsabilidade civil objetiva, tendo como sustentabilidade organizacional sua estrutura administrativa, constante no artigo 3º. Mas para que todos princípios administrativos sejam executados com eficiência, respeitando os princípios da legalidade, eficiência, moralidade, entre outros, a Administração Direta da PMF deve separar as funções do controle e a fiscalização e da execução da operação de suas metas e ações das atividades operacionais. Então, o administrador público, assim como o legislador, tem que separar a execução do controle e da fiscalização do desempenho para não impactar no princípio da segregação de funções. São características das autarquias a descentralização, a criação por lei, a especialização dos fins ou atividades, a personalidade jurídica pública, a capacidade de autoadministração e a sujeição a controle ou tutela. Vale destacar que, por conta de sua autonomia instituída, deve haver uma espécie de supervisão entre seu ente estatal instituidor e a autarquia, seja ele a União, o Estado, Distrito Federal ou Municípios. Instituição dotada de personalidade jurídica de direito público, descentralizada da união, estados ou municípios, instituída por lei, com autonomia administrativa e financeira com a supervisão e controle pelo governo, assim deveriam funcionar as relações entre os entes municipais – Administração Direta e Indireta.
O próprio Decreto nº 22.569, de 19 de Fevereiro de 2021, ao aprovar o Regimento Interno da COMCAP, ressalta sua autonomia administrativa e financeira, como veremos a seguir:
Art. 1º A Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP), criada, nos termos da Lei Complementar nº 618, de 2017, com personalidade jurídica de direito público, sede e fórum na cidade de Florianópolis à Rua 14 de Julho, número 375 no bairro Estreito, patrimônio próprio e autonomia administrativa e financeira, rege-se por este regulamento, pelas normas internas e pela legislação pertinente em vigor.
Apesar da Lei Complementar nº 706/2021, em alguns artigos citados resguardar estes princípios constitucionais, consolidada na Lei Orgânica do Município, mais adiante em alguns artigos, contradiz e reflete em grande escala a inconformidade Jurídica. É o caso do artigo 167 da 706/2021 que alterou o artigo 12 da Lei complementar nº 618/2017, que atribuiu duas Superintendências pertencentes a Administração Direta do Município como gestoras da Autarquia, condenando a sua autonomia prevista no art. 1º do Decreto nº 22.569/2021 e violando os artigos 13 da Lei Complementar 706/2021, assim como o Artigo 17 da Lei Orgânica de Florianópolis. A concretização da inconformidade, expressa a seguir:
Art. 167. Altera o art. 12 da Lei Complementar nº 618, de 2017, que passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 12. Compete à Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP):
I – executar, mediante delegação do Poder Executivo, por meio da Superintendência de Gestão de Resíduos da Secretaria do Meio Ambiente e da Superintendência de Limpeza Urbana da Secretaria Municipal de Infraestrutura, os serviços públicos de coleta, transporte e tratamento de resíduos sólidos, e limpeza dos logradouros e vias públicas, bem como outros que sejam com os mesmos conexos ou consequentes;
Pelo artigo 167, fica clara a interferência na autonomia administrativa ao vincular as Superintendências citadas, a primeira vinculada à Secretaria Municipal de Infraestrutura e a segunda vinculada à Secretaria do Meio-Ambiente. O que assistimos foi a transformação da COMCAP em dois grandes Departamentos da Administração Direta, conflitando a sua autonomia, com o conceito legal de autarquia. Em contato via telefone com sua Ouvidoria, o seu atendente informou que a COMCAP não existe mais, e que foi transformada em três grandes departamentos, o primeiro vinculado à Secretaria do Meio Ambiente, o segundo à Secretaria Municipal de Infraestrutura e o terceiro vinculado à Secretaria Municipal do Continente, através da contratação de empresa terceirizada. Este fato merece ser investigado.
Além da interferência citada acima, outra aberração jurídica é a ocupação do cargo de Diretor da COMCAP pelo Secretário Municipal de Infraestrutura, conforme o Parágrafo Único do artigo 87:
Parágrafo único. O cargo de Diretor-Presidente da COMCAP será ocupado pelo Secretário Municipal de Infraestrutura, sob designação, sem acumulação de provimentos.
I – do Diretor Presidente:
- a) representar institucionalmente a COMCAP perante a sociedade e organizações privadas e públicas;
O Secretário Municipal de Infraestrutura na linha hierárquica organizacional da Administração Direta é superior as respectivas superintendências, mas na COMCAP, como ocupante de Diretor – Presidente é inferior nesta linha hierárquica. Daí é válido os seguintes questionamentos:
- Como o Secretário Municipal de Infraestrutura, ocupando o cargo de Diretor Presidente da COMCAP poderá representá-la diante da sua própria Secretaria?
- Como Secretário Municipal de Infraestrutura vai fiscalizar o Diretor Presidente?
- Como o Diretor Presidente da COMCAP vai dirigir, coordenar e supervisionar todas as atividades da COMCAP, com foco na realização dos objetivos funcionais e institucionais da COMCAP, sendo concomitantemente Secretário Municipal de Infraestrutura?
- Controle interno
Ainda sobre o item “c” questionado acima, o Art. 76 em seu Parágrafo Único da Lei Orgânica, veda aos Secretários Municipais assumir outro cargo ou função na Administração Pública direta ou indireta, ressalvada a posse em virtude de concurso público, realizado anteriormente à data de sua diplomação, observado o disposto nesta Lei Orgânica;
Assim dispõe o preceito legal:
Parágrafo Único – Aos Secretários Municipais ou Diretores equivalentes são aplicáveis as vedações deste artigo, inclusive as que forem aplicáveis ao Prefeito Municipal.
Veja que o referente preceito legal não diferencia “com ou sem acumulação”, se assim o fosse, faria a devida ressalva.
- Segregação de Funções e impactos na COMCAP
A segregação de funções consiste na separação das funções de autorização, aprovação, execução, controle e contabilização. Para evitar conflitos de interesses, é necessário repartir funções entre os servidores para que não exerçam atividades incompatíveis, como executar e fiscalizar uma mesma atividade. (Acórdão nº 5.615/2008-TCU-2ª Câmara, salienta o princípio da segregação de funções). Mais adiante, complementando o entendimento delineado, o Acórdão nº 3.031/2008-TCU-1ª Câmara, ressalta a impossibilidade de se 1.6 […] permitir que um mesmo servidor execute todas as etapas da despesa, isto é as funções de autorização, aprovação de operações, execução, controle e contabilização. O que observamos na Prefeitura Municipal de Florianópolis contemplado na Lei 706/2021, é o descumprimento ou a violação deste princípio, atribuindo ao Secretário Municipal de Infraestrutura o Cargo de Diretor-Presidente da COMCAP, In verbis:
Seção IV – Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP)
Art. 87. A Autarquia de Melhoramentos da Capital, instituída por meio de Lei Complementar específica, vinculada à Secretaria Municipal de Infraestrutura, quando do cumprimento de suas atribuições legais, atuará em harmonia com a Secretaria na qual encontra-se vinculada e, ainda, no cumprimento dos objetos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
Parágrafo único. O cargo de Diretor-Presidente da COMCAP será ocupado pelo Secretário Municipal de Infraestrutura, sob designação, sem acumulação de provimentos.
Art. 88. São atribuições dos cargos e funções gratificadas vinculadas à Autarquia de Melhoramentos da Capital (COMCAP) e dispostas no Anexo V -D desta Lei Complementar:
I – do Diretor Presidente:
- a) representar institucionalmente a COMCAP perante a sociedade e organizações privadas e públicas;
- b) promover a interação entre os órgãos correlatos da administração pública do município de Florianópolis, a fim de obter sinergia de esforços na sua área de atuação;
- c) dirigir, coordenar e supervisionar todas as atividades da COMCAP, com foco na realização dos objetivos funcionais e institucionais da COMCAP;
O parágrafo único citado acima viola o princípio da segregação de funções, pois impossibilita ao Secretário Municipal de Infraestrutura, fiscalizar os atos do presidente da COMCAP, ocupado pelo mesmo servidor público. Este item da Lei não permite a separação das funções de autorização, aprovação, execução, controle e contabilização que devem ocorrer entre o Presidente da COMCAP e o Secretário Municipal de Infraestrutura, e por consequência, não evita conflito de interesses. E o que é pior, possibilita ao servidor ocupante do cargo, ocultar erros ou fraudes no curso normal das suas funções, no caso o Secretário Municipal de Infraestrutura e Presidente da COMCAP, afrontando os princípios da legalidade e moralidade da administração pública definidos na Constituição Federal.
Mas, a questão da segregação não está presente apenas entre estas duas funções (Secretário Municipal de Infraestrutura e Diretor Presidente da COMCAP) criadas pela Lei 706/2021, a violação está presente também com a criação das Superintendências de Limpeza Urbana e de Resíduos Sólidos. A primeira, vinculada à Secretaria Municipal de Infraestrutura, mediante artigo 45, e a segunda junto à Secretaria Municipal de Meio Ambiente, através do artigo 83. Ambas as Superintendências comandam e são comandadas. Por exemplo, algo inusitado e ilegal é o Secretário Municipal de Infraestrutura na estrutura organizacional da Administração Direta da Prefeitura ter como subalterno o Superintendente de limpeza Urbana, e concomitantemente ao ocupar o cargo de presidente da COMCAP, ser comandado pelo mesmo Superintendente.
Esclarecendo, contraditoriamente, observamos que na linha hierárquica organizacional da Administração Direta da PMF, o Superintendente de Limpeza Urbana é supervisionado pelo Secretário Municipal da Infraestrutura, no entanto na linha hierárquica da Administração Indireta, no caso a COMCAP, assistimos ocorrer o contrário, ou seja quem dá as ordens e supervisiona o presidente da COMCAP é o Superintendente da Limpeza Urbana. A Lei Complementar nº 706/2021, consolida uma mistura de funções e linhas hierárquicas entre a Administração Direta e Indireta, confundindo e interferindo a autonomia legal da autarquia, afrontando o conceito de autonomia e impactando o princípio da segregação de funções.
Deve-se ressaltar que própria Lei nº 706/2021, mediante o artigo 45, parágrafo único do Art. 87 e artigo 83, afrontam o princípio da segregação de funções, impedindo o controle financeiro do próprio artigo 77 da Lei 706/2021, assim como os artigos 63 e 64 da Lei Orgânica:
Art. 63 A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos órgãos e entidades da administração pública municipal, quanto à legitimidade, à economicidade, à aplicação das subvenções e à renúncia de receitas, é exercida:
Art. 64 O Poder Executivo instituirá e manterá sistema de controle interno para: § 3º Dentro dos prazos fixados nesta lei, o Poder Público Municipal submeterá as contas da administração direta e indireta, ao sistema de controle externo, mediante encaminhamento ao Tribunal de Contas do estado e à Câmara Municipal.
Neste diapasão é coibido ao Governo Municipal de Florianópolis a execução de atividades incompatíveis umas com as outras, para evitar erros, omissões, fraudes e o uso irregular de recursos públicos.
Por último, quando o Governo Municipal encaminhou as mensagens 01 a 05, em janeiro deste ano, em regime de urgência, interferiu na autonomia da Câmara Municipal de Florianópolis, principalmente impedindo perpassar a matéria por diversas comissões qualificadas, criadas exatamente para avaliar a consistência da legislação. A própria Procuradoria da Câmara Municipal de Florianópolis fez diversas observações neste sentido em relação aos pareceres promovidos junto as mensagens. O Poder Executivo, ao impor o regime de urgência, desqualificou leis aprovadas e interferiu no Poder Legislativo, numa extensão de braço administrativo do Governo Municipal de Florianópolis. Temos o entendimento de que projetos enviados ao legislativo em regime de urgência, devem ocorrer em decorrência de problemas como enchentes, rompimento de estruturas ligadas ao trânsito, abastecimento de água, furacões, endemias ou epidemias, estiagens, avalanches, incêndios, rompimento de barragens etc. Não entendemos que ajustes nas empresas públicas e autarquias, reorganização do modo de emprego, contratação e reordenamento dos serviços públicos municipais possam encaixar-se no regime de urgência, na tramitação da sua aprovação. Mas digamos que coubesse a medida, poder-se-ia esperar isso de um chefe de executivo reeleito? Ele teve um mandato inteiro para estudar as reformas e buscar soluções técnicas, jurídicas e políticas compatíveis com os casos tratados! Seria bom juntar essa abordagem nos pleitos legais e constitucionais, porque, pelo visto, com este tipo de tratamento dado, deixou de ouvir os órgãos do legislativo que dariam sustentabilidade institucional às mudanças. E foi o caso da lei 706/2021, aprovada com diversas inconsistências legais.
Desta forma:
Considerando que a Lei nº 706/2021, pelo exposto acima, não mantém coerência em seus artigos com diversos conflitos e contradições, impactando sua eficácia. Além disso, não e coerente com a Lei Orgânica de Florianópolis, por conta disso, temos o que é definido como antinomia, que é o conflito entre duas normas, ou seja a lei deve enunciar termos e conceitos legais coerentes com outras normas, para não acarretar insegurança e arbitrariedade na sua aplicação, evitando contradições lógicas;
Considerando que a LC 706/2021 descumpriu o artigo — da Lei Orgânica permitindo acumulação de cargos pelo Secretário Municipal de Infraestrutura concomitante ao cargo de Diretor Presidente COMCAP;
Considerando, por conta das incoerências legais citadas, foram realizadas alterações no funcionamento da COMCAP, que geraram ilegalidade conflitando com a Lei Orgânica do Município, pois é clara a superioridade hierárquica deste dispositivo em relação às outras normas no âmbito municipal. A Constituição Brasileira é clara ao enfatizar o Município reger-se-á por sua lei orgânica, contemplada na Constituição Estadual de Santa Catarina, em seu art. 111;
Considerando que o Governo Municipal ao descumprir preceito legal de seus atos administrativos afetam os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, transcrita no art. 37 da Constituição Brasileira, contemplado no artigo 19 da Lei Orgânica de Florianópolis;
Considerando que o Governo Municipal de Florianópolis pelo princípio da legalidade, deve fazer apenas o que a lei permite. Nesta linha de raciocínio, é importante frisar o Decreto-Lei 201, de 27 de fevereiro de 1967, que trata sobre a responsabilização de prefeitos e vereadores, trazendo normas de conteúdo penal, mas também de responsabilizações político-administrativas, e uma das previsões da norma é a prática de crime de responsabilidade por parte do Prefeito Municipal, por negar execução à lei, ou deixar de cumprir ordem judicial sem justo motivo/impossibilidade;
Considerando que fica claro o descumprimento da Lei Orgânica Municipal, Decreto Lei 200/67, inobservância da segregação de funções mediante princípio da moralidade (art. 37, da CF/88), impactando na Lei Complementar 706/2021, no Decreto nº 22.569/2021 (regimento interno da Autarquia de Melhoramentos da Capital – COMCAP) e na Lei 618/2017;
Considerando a inobservância da Lei Complementar nº 706/2021 junto às leis do saneamento básico municipal, estadual e federal, notadamente a Lei 11.445/2007, Lei Municipal 7474/2007, Lei 9400/2013, Lei do Lixo Zero, aprovado pelo Decreto 18.646/2018, além da desconexão do Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico – PMISB e o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos – PMGIRS, aprovado pelo Decreto nº 17.910/2017, impactando seriamente a governança das políticas públicas de saneamento básico de Florianópolis e rejeitando toda participação popular nas conferências municipais;
Considerando a “ingerência” do Governo Municipal de Florianópolis na Câmara Municipal de Florianópolis, transformando o papel do Legislativo em entidade desnecessária, prejudicando a função de legislar e fiscalizar as ações do Poder Executivo. A Constituição diz que o Poder Legislativo tem de fazer leis e fiscalizar os atos do Executivo. Não é questão de direito, e sim de dever. O Legislativo tem o dever de fiscalizar se as políticas públicas estão sendo aplicadas adequadamente, se o dinheiro público está sendo bem gasto, enfim, se não está havendo corrupção. Então cabe ao Legislativo, fiscalizar todas as questões que envolve a aplicabilidade da legislação, envolvendo a governança do saneamento básico em Florianópolis, impactado negativamente pela aprovação da Lei Complementar nº 706/2021;
Considerando a impossibilidade de execução dos artigos 63 e 64 da Lei Orgânica de Florianópolis, assim como do art. 77 da LC nº 706/2021, afetando a gestão administrativa e financeira, impedindo a execução da competência da Secretaria Municipal de Transparência, Auditoria e Controle, envolvendo a COMCAP.
Solicitamos
- Resgatar integralmente a autonomia da COMCAP, conforme modelo estrutural administrativo e financeiro existente antes da lei 706/2021, revogando todos os atos administrativos e legislativos ilegais a partir da sua vigência, incluindo a revogação do Decreto 22569/2021, as alterações ocorridas na Lei 618/2017, tendo em vista as incoerências e violações à Lei Orgânica de Florianópolis, Decreto Lei 200/1967, Constituição Federal, Constituição Estadual de Santa Catarina, impactando nos princípios da legalidade, em particular na segregação de funções, expostos nesta representação. A lei 706/2021 na pratica extinguiu de forma ilegal a COMCAP, transformando-a em dois departamentos da Administração Direta da PMF, no caso as Superintendências. Por conta disso:
- Auditar junto a Lei nº 706/2021 os diversos conflitos e contradições entre os seus artigos impactando sua eficácia, citados nesta representação, confusão entre os conceitos legais entre Administração Direta e Indireta;
- Auditar as incoerências evidenciadas entre esta LC e a Lei Orgânica de Florianópolis, evitando acarretar insegurança e arbitrariedade jurídicas na sua aplicação. É clara a superioridade hierárquica deste dispositivo (Lei Orgânica) em relação às outras normas no âmbito municipal. A Constituição Brasileira é clara ao enfatizar que o Município reger-se-á por sua lei orgânica, contemplada na Constituição Estadual de Santa Catarina, em seu art. 111;
- Auditar a função Saneamento Básico, como política de estado, incorporando todas as propostas de reestruturação administrativa indicadas pelo Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico, transformado na Lei Municipal nº 9400/2013, validada pelas conferências municipais e na revisão do PMISB, contemplada na consulta pública, publicada na página: https://www.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/28_01_2021_14.02.38.2702fa6dabba3692679338f9eac54d38.pdf, impedida pelo Governo Municipal mediante Lei Complementar nº 706/2021. Observe que no PMISB a política e execução da Política de Saneamento foi incluída uma única Secretaria Municipal de Saneamento Básico, organograma exposto na consulta pública, a partir de fevereiro de 2021, encaminhada pela equipe da própria PMF, firmado pelo próprio Prefeito Municipal, como consta no corpo da consulta, diferente das diretrizes apontadas pela LC 706/2021, aprovado em janeiro de 2021;
- Auditar as inconformidades jurídicas no ensejo da Lei Complementar nº 706/2021 diante Lei Federal nº 11.445/2007, Leis Municipais 7474/2007 e 9400/2013 (PMISB), Decretos 18.646/2018 (Lixo Zero), 17.910/2017 (PMGIRS), assim como com as deliberações aprovadas pelas Conferências Municipais de Saneamento Básico pela sociedade e respectiva revisão do PMSB. As políticas de estado de saneamento básico, aprovadas pela sociedade em conferências, foram desarticuladas pela Governo Municipal coma LC 706/2021;
- Auditar a ausência de reuniões do COMSAB, em função das ilegalidades promovidas pela LC 706/2021, que não levou em consideração a governança social do saneamento básico. Incrível que após o crime ambiental da Lagoa da Conceição e outros assuntos pertinentes, o COMSAB ainda não tenha realizado uma única reunião em 2021;
- Auditar o descumprimento do princípio da segregação de funções entre os cargos de Secretário Municipal de Infraestrutura e Diretor Presidente da COMCAP, entre Secretário de Municipal de Infraestrutura versus Superintendente de Resíduos Sólidos versus Superintendente de Limpeza Urbana e Diretor Presidente da COMCAP e vice e versa;
- Auditar a acumulação dos cargos de Secretario Municipal de Infraestrutura e Diretor Presidente da COMCAP, coibida pela Lei Orgânica de Florianópolis;
2. Auditoria nas violações provocadas pela LC 706/21 junto as Leis Municipais 7474/2007 e 9400/2013, especialmente:
- No art. 98 da Lei Complementar 706/2021 ao vincular o COMSAB a Secretaria do Meio Ambiente sem a alteração da paridade (art. 6º 7474/2007) e nem tão pouco alterou a respectiva presidência (art. 8º da Lei Municipal nº 7474/2007);
- Nos artigos da LC nº 706/2021 que dispersou e enfraqueceu a política e a infraestrutura de saneamento básico de Florianópolis em diversas Secretarias Municipais, impactando no cumprimento das metas e ações aprovadas para o PMISB pela Lei Municipal 9400/2013, comprovado pelas minuta da revisão em consulta pública nos site: https://www.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/28_01_2021_14.02.38.2702fa6dabba3692679338f9eac54d38.pdf;
- Nos artigos da LC 706/2021, citados nesta representação, que não permitem a implantação da regulação de fiscalização junto a dimensão do Saneamento Básico Resíduos Sólidos por órgão externo, contemplado no 16 da Lei Municipal nº 7474;
- Na LC nº 706/2021 que desarticulou o Fundo Municipal de Saneamento Básico, ao atrelar o COMSAB a Secretaria de Meio Ambiente e o controle financeiro e execução dos recursos a Secretaria de Infraestrutura, não permitindo ao COMSAB o auxílio na administrativo, conforme artigo 17 da Lei Municipal nº 7474/2007;
3. Suspensão urgente da consulta pública do Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico – PMISB, citada em item anterior, tendo em vista a desarticulação entre a política de saneamento básico aprovado pelas conferências municipais, contemplado na proposta da Consulta Pública e a LC nº 706/2021, já comunicado municipalidade, conforme anexo;
4. Apurar a desconexão entre o Saneamento Básico de Florianópolis e a LC 706/2021, apresentado ao Ministério Público do Estado de Santa Catarina, cópia anexa;
5. Por fim, apurar todas ilegalidades provocadas pela LC 706/2021 e os atos administrativos efetivados, tendo como parâmetros os transcrita no art. 37 da Constituição Brasileira, contemplado no artigo 19 da Lei Orgânica de Florianópolis.